terça-feira, 24 de novembro de 2020

O romantismo se vai aos poucos

Nunca escondi aqui que venho duma família com certa relação com a política, mais precisamente a política de São Francisco de Paula. Era um bebê ainda e tinha as atenções do meu pai divididas com uma campanha eleitoral; cresci, pois, num ambiente eleitoral e assim foi, pelo menos, até  ano de 2004. Depois foi arrefecendo, quando em 2008 eu manifestei pela última vez minhas predileções, já sem o mesmo ímpeto de antes. Nunca fui filiado a partido algum, todavia. Meu pai, há anos deixou a vida partidária e, inclusive, sequer mais vota em São Chico, e isso já faz tempo.

Perdi (ou perdemos) a embocadura de forma tamanha, que o resultado das eleições em São Chico esse ano me surpreendeu bastante. Não tanto o vencedor, mas a diferença para com o segundo colocado.

Enfim.

A realidade é que mais claro ainda eu já fui aqui, do quanto sou saudosista. Não acho que eu tenha largado a política, mas sim ela que me largou. Sei lá, mas ainda acredito num romantismo que hoje certamente já não mais existe. Do tempo que as pessoas ainda acreditavam num propósito e lutavam por uma ideologia. A meu ver, data vênia, politica e ideologia hoje em dia sequer coabitam mais.

Disse tudo isso como prelúdio para expressar aqui meu lamento pelo falecimento de Sérgio Bandoca Foscarini da Silva, o Bandoca. Vereador em São Chico por quatro oportunidades e prefeito da minha cidade entre os anos de 2001 e 2004. Não nos alinhávamos no pensamento ideológico na maioria das vezes; tampouco, admito, alguma vez fui seu eleitor. Mas reconheço que fora um homem público dedicado a sua causa, um apaixonado por São Chico de Paula, como ele mesmo se referia, e como disse em algum comentário em rede social, admirado por adversários e correligionários políticos, ao mesmo tempo, o que é para poucos, convenhamos.

A meu ver, Bandoca era um político por profissão. E extremamente competente nisso. Para ele, a política não começava às vésperas de um pleito, mas se dava a cada novo dia. Quem, afinal, podia não gostar de ser chamado de "meu negrinho" ou "minha negrinha" cada vez que era avistado por ele?

O exemplo do que vos falo está nas palavras do Dr. Décio Colla, que além de médico é um grande político da cidade, talvez o maior "rival" do Bandoca, no que tangia a projeto político:

"BANDOCA

QUANDO CHEGUEI AQUI HÁ 52 ANOS ATRÁS VOCÊ ERA UM GURI DE 17 ANOS, ESTRABULEGA, HUMILDE, ALI DO CIPÓ, FILHO DO BANDOCA DO ARMAZÉM. E JÁ PROMETIA, ERA METIDO, FALAVA GROSSO E ALTO E ESSE GURI CEDO ENTROU PARA A POLÍTICA, COM UM FORTE APELO POPUPLAR QUE O NORTEOU POR TODA SUA VIDA, SEMPRE SE LEMBRANDO DE AJUDAR O PRÓXIMO. QUE BOM QUE FOI ASSIM.
POLITICAMENTE SEMPRE FOMOS ADVERSÁRIOS, ADVERSÁRIOS MESMO, MAS SEMPRE FOMOS LEAIS E NÃO TEM COISA MAIS LINDA QUE SER LEAL, NUNCA PRECISAMOS DE SUJEIRA OU DESLEALDADES. QUANTAS VEZES PERDEMOS OU GANHAMOS SEMPRE EM JOGO LIMPO. DIFERENTE DOS TEMPOS DE HOJE QUANDO A TECNOLOGIA NA MÃO DE MAUS E O EXCESSO DEDINHEIRO EMPORCALHAM E INVERTEM RESULTADOS.
E HOJE PERDEMOS VOCÊ. NUNCA NO INÍCIO DA MINHA VIDA PÚBLICA, QUANDO AINDA BEM JOVEM E INEXPERIENTE,IMAGINEI QUE CHORARIA POR UM ADVERSÁRIO POLÍTICO, MAS HOJE CHOREI POR VOCÊ BANDOCA QUANDO RECEBI A NOTÍCIA E A FUNCIONÁRIA QUE CUIDA DA MINHA CASA GRITOU CONSTERNADA “ O TIO DÓCA? “. “TIO DÓCA” QUER DIZER O HOMEM HUMILDE DO CIPÓ, O QUE SE PREOCUPA COM OS OUTROS, O QUE PROTEGE, E AJUDA. AÍ O TEU VALOR, UM SER HUMANO E ADVERSÁRIO LEAL. É UMA PERDA MUITO GRANDE PARA TODA SÃO FRANCISCO.
TRISTE PARA NÓS,MAIS TRISTE E DOLOROSO PARA OS FAMILIARES ACOSTUMADOS COM SUA VOZ DE COMANDO QUE AGORA SILENCIA. MAS UMA COISA NOS CONFORTA, FOI RECEBIBO PELO SEU PAI E PELA SUA FILHA TÃO AMADA, CERTAMENTE DE BRAÇOS ABERTOS COM AQUELE SORRISO LINDO E DOCEQUE VAI SABER CONDUZÍ-LOEM DIREÇAO À LUZ E À
PAZ.
UM GRANDE ABRAÇO À FAMÍLIA QUE, NESTE MOMENTO DE TANTA DOR, TEVE A GRANDEZA DE DOAR OS ORGÃOS, COROANDO COM ESTE GESTO O TIPO DE VIDA E DE ENTREGA QUE ELE SEMPRE TEVE AOS SEUS SEMELHANTES."


E com estas belas palavras do Dr. Colla, reitero meus sentimentos à toda família do Bandoca, por esta triste perda.

Penso que com o falecimento do Bandoca, mais certo estou eu que o romantismo que rondava a política (a velha é claro) se vai aos poucos.

Imagino, pois, também, que no que tange a política, parece que eu segui a minha vida e ela foi ficando pelo caminho.

Em suma, preciso registrar que a realidade é de se lamentar.

O tempo passa e a vida está cada vez mais implacável.

Implacável!

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