quarta-feira, 28 de junho de 2017

Relembrando (final)

Relembrar é viver, mesmo que com saudosismo ou nostalgia. A publicação de hoje não foi, nem de perto, a mais lida ou visualizada por aqui, mas deve ter sido um dos textos mais bonitos que eu já escrevi, carregado de emoção e honestidade. Foi uma homenagem ao grande Jader Moreci Teixeira, o Leonardo, que havia falecido, precocemente - vos digo, três dias antes. Leonardo responsável por grandes sucessos da nossa música, além de produtor responsável por lançar ao grande público artistas como Gaúcho da Fronteira. Mais tarde, soube da história dele com Régis Marques, o que me fez ter maior certeza que a homenagem que eu fiz foi muito bem vinda e necessária. 

Infelizmente, o Jader faleceu. O grande Leonardo, contudo, não morrerá jamais:

"Leonardo, um gaúcho!

Leonardo emalou seu pala branco e se foi. Não, contudo, sem andar por estas coxilhas, sentindo as flechilhas das ervas do chão. Este Homem do Pala Branco que através do seu canto olhou para o seu rebanho estendendo a mão, juntando ovelhas perdidas pelas estradas, veio sim, pedindo morada em nossos corações. E conseguiu. Esta cria de Bagé que falava de Erechim com história e canto e que cantava o Rio Grande com maestria e encanto partiu para uma nova morada. Jader Moreci Teixeira emalou seu pala branco e se foi. Não sem antes ter os pés rosetados de campo que ficam sempre mais trigueiros com o sol do verão. Fez tantos e magistrais versos cantando as belezas desta natureza sem par, e mostrou pra quem quiser ver que existe um lugar pra viver sem chorar. Fez do pago a sua bandeira de luta e dando um Viva a Bombacha pôs-se em defesa desta querência galponeira em que vivemos. Não importava se chovia ou fazia um sol de rachar, Leonardo nunca deixou de demonstrar a sua essência de gaúcho. Leonardo foi sim um gaúcho, um verdadeiro gaúcho. Não se considerava um pregador, um padre nem pastor. Segundo o próprio, era um autor que cantava as suas verdades. Não tinha credo em almas perdidas porque alguém com as mãos erguidas iria chegar além da vida para salvar a humanidade. O Gaúcho emalou seu pala branco e se foi.
Leonardo teve uma sensibilidade tamanha, que abriu seu peito pelas Tertúlias Rio Grande afora em defesa de nossas prendas dando um grito de Morocha não! Aprendeu e ensinou que um gaúcho não faz da sua prenda um capacho e que os deveres de um dito macho é proteger e amar. Ahh, o amor... O Jader amou este Rio Grande como poucos, amou o seu povo. Não esqueceu, todavia, daqueles Desgarrados do Pago que mesmo estando afastados nunca perderam sua identidade. Segundo ele, era o que mais tinha importância pois bem maior que o tamanho da distância é o tamanho da saudade. Leonardo emalou seu pala branco e partiu, não sem antes, banhar-se nas fontes e sentir horizontes com Deus. Sentiu em seu peito que as cantigas nativas continuavam vivas para os filhos seus. Ensinou-nos a jamais, repito jamais, perder a esperança das coisas deste Rio Grande. Viu os campos florindo e as crianças sorrindo felizes a cantar e mostrou mesmo para quem quiser ver qual é o verdadeiro lugar pra viver sem chorar. Subiu a serra e fez levantar o bugio que parecia lá em São Chico ter morrido de frio e estava sendo velado na beira do rio. Destapou o caixão e o danado sorriu, o bugio, um serrano ora, não morre de frio. Enfim o bugio não estava morto, roncou a cordeona e ele gritou bem alto: Levanta Bugio! Cantou com eficácia a saudade que sentia de Honeyde Bertussi, o cancioneiro das coxilhas.
Dá madrugada de domingo pra cá calou-se uma parte da nossa história. Perdemos parte do nosso brilho, do nosso encanto e já podemos dizer um: Que Saudade! A dor da perda, no entanto, se atenua quando em nossa mente surgem as boas lembranças de um gaúcho que ao longo de suas sete décadas de vida tratou de nos servir com seu talento, com sua genialidade e com sua perseverança. Um canto simples, puro e singelo que tratou de reunir fãs além fronteiras e que na boca desta gente não morrerá jamais. Se foi o Jader, mais o Leonardo continuará eternamente vivo nas páginas da história deste nosso Rio Grande. É nosso e do Leonardo este Rio Grande do Sul: Céu, Sol, Sul, Terra e Cor, onde tudo que se planta cresce e o que mais floresce é o amor. Leonardo daqui pra frente não estará mais junto a nós de corpo, mas sim, sempre de alma, canto, fé e esperança." (publicado em 10/03/2010)


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Em breve o BLOG DO CAMPEIRO alcançará seus 10 anos de atividade. A ideia de relembrar algumas postagens voltará por aqui.

Por ora, encerro, agradecendo a compreensão de todos.

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