terça-feira, 16 de setembro de 2014

O gauchismo da moda

Dias atrás, recebi críticas por não estar andando pilchado nestes dias que antecedem o glorioso vinte de setembro. Tá certo que a desaprovação fora no seio familiar, mas, nem por isso, menos eloquente. De fato, ainda não vesti minha bombacha, tampouco calcei a bota ou maneei o lenço no pescoço neste mês farroupilha; e sabe o que isso significa? Nada (ou quase). Ao menos para mim. Todos que me conhecem sabem da minha vocação gaúcha, meu apreço pelo tradicionalismo e minha ligação com a música e as coisas gaudérias. Minha essência é gaúcha e tradicional, pois. Não será, daí, estar ou não usando bombacha, calçando bota e com o lenço tremulando ao pescoço que serei mais ou menos tradicionalista. Isso tudo, é claro, um pensamento meu que é passível de outras condenações mediante posicionamentos contrários.

Pior que isso, a meu ver, são aqueles que tem uma bombacha só, guardada no fundo do armário e abrigando o mofo, ou sob o odor de naftalina, e que nesta época do ano, justamente, resolvem botar um ar na peça e passam a semana inteira pilchaditos. A grande maioria, sem sequer saber para que serve um tirador e até mesmo um barbicacho. Estes seriam o que o músico João Luiz Corrêa, em um dos tantos sucessos de sua carreira, definiu como os "gauchões de apartamento". Merecem estes "gaudérios" uma voz forte de contrariedade deste que voz escreve? Talvez, não. Explico.

Muito pior que usar bota, bombacha, lenço e chapéu apenas uma semana por ano, são aqueles que renegam suas origens e tratam a nossa tradição com desdém e deboche. Pois vejam que o município de Novo Hamburgo este ano sequer liberou verba para a Semana Farroupilha, porém, não deixamos de ter o carnaval. É o carnaval uma cultura nossa? Sim, mas emprestada e não genuína. Sabem qual é o público do Carnaval de Novo Hamburgo? Irrisório a julgar que vivemos em uma cidade com mais de duzentos mil habitantes. Nesse ínterim, deixo claro que não sou contra o carnaval, apenas exemplifiquei. O problema não está só nas municipalidades (algumas). Nossa imprensa, em parte, não é muito melhor.

Precisa estar pilchado para apreciar a nossa tradição? Óbvio que não!

Tenho um familiar que é dançador e apreciador de uma boa música gaúcha, como poucos. Não refuga convite para um bom fandango. Pois o vivente nunca colocou uma bombacha. Nunca. É menos gaúcho? Não! Precisamos lamber nossas próprias feridas. Estamos num processo de involução, onde, cada vez mais rígidos, os CTG's acabam por afastar a sociedade de seus esteios. Noutra senda, surgem alguns "tradicionalistas" adeptos a este gauchismo da moda, que andam pilchados porque parece bonito e pode trazer algum "status" em uma camada polarizada da sociedade.

Pois muitas vezes andei bem gauchão pelos corredores da faculdade. Uns, poucos é verdade, de certo me achavam ridículo. Retribuía com o mesmo desprezo. A maioria aparentava uma visão de admiração, quer por eu ser gaúcho que tem respeito às suas tradições e, principalmente, pela minha coragem. Ao mesmo tempo em que não se precisa coragem para andar pilchado, não se pode andar pilchado para bonito. A tradição não é feita de moda, porém, a tradição pode sim evoluir.

Vamos abrir as portas dos CTG's para todos os que querem entrar e respeitar o que é nosso. Ao mesmo tempo, vamos lembrar da nossa bombacha, esquecida no fundo do armário, com mais frequência. Como um ar faz bem de ora em vez. Se estão certos os que me julgam por não andar bem gaúcho e mostrar o que sou? Claro! De que me vale a essência para mim sem espalhar para os demais que me cercam?

A culpa é toda minha, confesso. Pois neste compasso, chegará o dia que dirão que sou um gaúcho da moda, de apartamento. Logo, nada mais me resta senão levantar, vestir a bombacha e ir à luta! Como é bom tomar um ar e pegar um sol, não é verdade?

Abraço e boa semana farroupilha a todos.  


PS.: Muito bem alertado pelo querido amigo Aristeu Nunes, pai do nosso festejado colaborador Rodrigo de Bem Nunes, o CTG pode ser sim palco para casamentos crioulos, tal qual o seu com dona Marindia. Não duvido mesmo que fora um festão amigo Aristeu! Fraterno abraço e gracias pela leitura e oportuna correção.

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