segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

Os homens não perdoam

A chegada do amigo Rodrigo de Bem Nunes como novo colaborador deste blogue não está diretamente ligada ao meu abandono de temas mais polêmicos do cotidiano, mas confesso que é uma tendência natural que eu volte a me dedicar mais para aquilo que fez surgir este espaço, qual seja, o tradicionalismo gaúcho. Aos poucos o Rodrigo anda recebendo mais elogios e trazendo novos leitores, a ponto de eu já ter pensado que chegará o dia que me mandarão embora daqui (risos). Brincadeiras à parte, fico muito feliz com o sucesso do meu amigo algo, aliás, que vem desde os tempos em que estudávamos juntos no Colégio Santa Catarina. O assunto que abordarei hoje será um dos últimos textos em que escreverei sobre assunto com relativa polêmica. E terá, como de costume, opinião. Falarei sobre o transcurso de 1 ano da tragédia de Santa Maria.

Inegavelmente este é um tema que mexe com todas as pessoas, pois causou tamanha repercussão e comoção social. Não sei o que passa na cabeça dos familiares das vítimas e espero nunca ter de saber. Entendo que a dor e necessidade de se fazer justiça é algo que se perpetuará no tempo e se manterá nos corações desta gente. Logo, não creio que devemos esquecer tudo que ocorreu, mas é preciso dar um passo a frente. Do contrário, nunca seremos pessoas mais evoluídas e tragédias como a ocorrida a exatos 365 dias haverão de ocorrer novamente.

Jornais e periódicos da capital e interior deste estado tiraram o dia de ontem para remoer a tragédia em detalhes. Não estão errados, afinal, o negócio deles é vender e obter lucro, como toda e qualquer negócio. Mas é melhor relembrar ou tentar esquecer? Se por um lado a relembrança nos trás a tona a necessidade de se fazer justiça e encontrar algum (ou alguns) culpado e que estes sejam punidos, bem como que o poder público e nossos legisladores hajam para o fim de coibir novas catástrofes do gênero, acho que a alma das vítimas e as próprias famílias precisam serem respeitadas e o esquecimento relativo do fato tem de ser construído. Quando falo em esquecimento não pugno pela impunidade de nada e nem ninguém, mas sim na continuidade da vida. Por isso, a relativização. 

Se me perguntassem o que imagino pensarem os familiares, certamente falaria que, para eles, o papel da imprensa é fundamental, pois não deixam o povo transformar o fato em mais um infortúnio da vida. Mas é preciso ter cuidado. Tanto os donos da Kiss quanto os músicos da banda que se apresentava no local já estão condenados pela mídia. Basta definir a pena. Divirjo e muito nisso tudo. Há muito mais gente envolvida que fora isentada de culpa preliminarmente. E desde o dia do fato não creio que os acusados tenham agido com dolo, de modo que em sendo processados, assim deveriam por homicídio culposo, quando não há a intenção de matar.

E para aqueles que acham que a nossa legislação é branda, falha e que o Código Penal é bonzinho demais para os bandidos, quero que saibam que as leis penais foram feitas para a proteção dos inocentes e não a dos culpados. A julgar as falhas e dificuldades que temos na condução de um processo criminal, dar munição para os inocentes é sinal de asseguramento da não perpetuação da injustiça.

Em suma, no tocante ao episódio de Santa Maria, é preciso conter a emoção e conduzir a instrução processual de forma inidônea, sob pena, não raro, de cometermos mais injustiça ainda. Encerro este com as palavras magistrais de Francesco Carnelutti, em As Misérias do Processo Penal (p.77):

"Nem aqui seja dito, ainda uma vez, contra a realidade que se quer de fato  protestar. Basta conhece-la. A conclusão de havê-la conhecido é esta: as pessoas crêem que o processo penal termina com a condenação e não é verdade; as pessoas crêem que a pena termina com a saída do cárcere, e não é verdade; as pessoas crêem que o cárcere perpétuo seja a única pena perpétua; e não é verdade: A pena, se não mesmo sempre, nove vezes em dez não termina nunca. Quem em pecado está perdido, Cristo perdoa, mas os homens não".

Abraço e boa semana a todos.

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